MARIZEIRA FRONDOSA AO LADO DO CHIQUEIRO - Em minha infância, ainda não eram cercadas as terras na beira do rio, no lado de cá da ponte, que pertenciam ao Sr. Messias Araújo. Hoje o arame farpado ao redor delas impede Santana de expandir-se para além do Humaitá. O que era várzea aberta, povoada de canafisteiras onde se aninhavam canários, rolinhas e cabeças-de-fita, hoje é só canarana. A meninada devassava com gosto aquele chão, para armar alçapões e tomar banho no rio, sob imponente marizeira, que não sei se ainda existe, se foi perversamente cortada ou se foi lamentavelmente arrastada rio abaixo, na grande enchente. A frondosa árvore alçava-se ao céu, bem no canto de enorme chiqueiro de porcos. Eram bem uns quarenta porcos! Mais da metade do chiqueiro era tomada por lama, que chegava às costelas dos suínos e aos joelhos dos tratadores. Achava-se então que porco gosta de lama, precisa de lama. Então haja lama para eles: carregava-se água do rio em velhas latas de querosene, para deixar no ponto, bem pastoso e abundante, o lamaçal da pocilga.
PORCÕES ALIJAVAM PORQUINHOS NA LAMA - Hoje sabe-se que porcos, como todos os seres vivos, gostam mesmo de água, para refrescar-se do calor. Quanto mais limpa melhor! Por aí afora, longe do Brasil, em viagens que fiz a serviço do ministério presbiteral, observei como os animais, também os porcos, se criam limpinhos. Nunca vêem lama! Vivem forrados por grossa camada de serragem, periodicamente substituída e assim são criados limpos e sem verminose, sadios e felizes. Mas quando meninote, eu gostava de apreciar a criação, perto da marizeira, na barranca do rio Acaraú. Minha curiosidade juvenil coincidia, às vezes, com a chegada do dono trazendo comida. Os sacos de milho despertavam animado fuzuê entre os inquilinos. Na hora de avançar, os porcões alijavam os porquinhos para fora do cocho e muitos destes caíam na lama. Achava divertido aquele jiu-jitsu suíno dos porcos maiores rapinando a refeição dos porcos menores. Os mais fortes levavam vantagens e os mais fracos herdavam a lama, para consolo e compensação. Claro que os maiores eram sempre mais gordos do que os menores!
ATÉ SUÍNOS DÃO LIÇÃO DE ASSEIO - Observando o rio de lama que se derrama dentro de nossas casas a partir da vida política brasileira, pergunto-me se aquelas lembranças da infância não teriam algum valor de parábola. Antes de responder, sou forçado a tirar duas conclusões imediatas, a partir da cascata de sujeiras: 1. “Nosso povo deve gostar de lama!” 2. “A melhor estratégia de convivência e superação é empurrar o mais fraco na lama!”Ora, ninguém gosta de lama e descobriu-se que até suínos dão lição de asseio. Todos preferimos andar limpos e de banho tomado. Somos filhos de Deus, que é limpo e faz tudo limpo. Sujeira e mau cheiro procedem de outras fontes. Geralmente as fontes imundas da cupidez, que não recua diante de nada, a fim de atingir seus objetivos. Para isso, pode ajudar muito um lamaçal ao alcance da mão. É mesmo lamacenta e mal cheirosa a impressão que se tem do atual momento político brasileiro. A lama política salpica na cidadania e adoece a esperança. Como ,acreditar em futuro luminoso, para o país gerido por tais elites?
.NÃO SE FAZ POLÍTICA NA POCILGA - Em exame de consciência, apliquemos a parábola suína à política e às eleições na santa terrinha da Senhora Santana. Passamos a vida escutando que somos criaturas de Deus, que somos filhos de Deus, que somos irmãos uns dos outros. Mas quando chegam as eleições, toda a sublimidade se apaga e nos enclausuramos em pocilgas morais. Vale qualquer sujeira, para atingirmos nossos objetivos, para não perdermos as eleições. Valem cartas anônimas, papeluchos pejados de abjeção, as mais descaridosas e fratricidas difamações. Anonimatos medrosos, ausência completa de caráter e de brios, prazer doentio de esconder-se para atirar. Eis as perfeitas indicações para não votar em quem faz isso! Covardes e traiçoeiros não possuem condições morais para liderar a comunidade.Tal escória quer a política para se aproveitar! É o que, no momento, assistimos, escorrendo de Brasília pela televisão A dor maior é que nosso povo custa a aprender e por isso paga sozinho o preço da corrupção. Mas não adianta discursar. Menos retórico e menos inútil é examinar nossas consciências. Talvez, iluminando-nos por dentro, descubramos que nossa revolta contra o que a mídia reporta é provocada por disfarçada dor-de-cotovelo, porque não somos nós que estamos desfrutando..
INDIGNAÇÃO MORAL OU HIPOCRISIA? Sugiro perguntas para o exame de consciência: 1. Por baixo dos panos, dos paletós e gravatas, não estaria acontecendo aproveitamento semelhante do dinheiro público em nosso Município? 2. Em nosso Município, o dinheiro público é realmente gerido com transparência e participação da população? Ou tem coisa mal cheirosa acontecendo atrás da moita? 3. Nossa presente indignação é gerada pelo amor ao bem comum ou não passa de escândalo farisaico e de rancor, por não sermos nós os beneficiários das facilidades desonestas? 4.Que moral possuem nossa ausência e nossa omissão nas iniciativas comunitárias, nossa incrível e barata capacidade de nos deixarmos corromper? 5. Não seria verdade que os políticos são o retrato moral chagado e chuspido daqueles que os elegem?
DIABO AFOGOU MANADA DE PORCOS - Fundamentando nosso exame de consciência, o evangelho de Mateus narra um dos episódios mais instigantes na vida de Cristo: Jesus chegou à outra margem do Mar da Galiléia e entrou na região dos gadarenos. Dois possessos, que moravam nos túmulos do cemitério, vieram ao seu encontro. Eram tão violentos que ninguém ousava passar por aquele caminho. Jesus expulsou os demônios e livrou os dois da possessão. Antes, porém, de saírem, os demônios suplicaram que Jesus os deixasse entrar na manada de porcos, que por ali pastava. Foi dado o consentimento. Possuídos pelos demônios, os porcos precipitaram-se despenhadeiro abaixo e caíram no mar, morrendo afogados.
DEMÔNIOS NÃO MORREM AFOGADOS - E os demônios? Será que morreram afogados, junto com os porcos? Improvável, pois demônios nadam bem em todas as águas, sobretudo nas turvas e sujas. Para onde então eles se mandaram? Pelo que vemos atualmente no denuncismo hipócrita de muito fariseu e na lama impenitente subindo até ao nó da gravata de não poucas “excelências”, não é improvável que aqueles maus espíritos tenham achado guarida, na parte suína da política brasileira mergulhada em sujeira, como seus antigos locadores gadarenos. O episódio bíblico intrigante se encerra, com os habitantes daquela região solicitando a Jesus que fosse embora dali. Botaram Jesus para correr, pois preferiam a companhia dos seus queridos porcos.
sexta-feira, 28 de setembro de 2007
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