RIOS DESAGUANDO NO MAR - O câncer de laringe ainda não me levara a voz e eu funcionava como professor mais ou menos bem sucedido de filosofia escolástica, na UVA de Sobral. Naquele semestre, o curso cresceu, até desembocar na figura imensa de Santo Agostinho. Ontem e hoje, quando se fala em sabedoria cristã, Agostinho é sempre lembrado.Vi sua presença invisível, em visitas inesquecíveis às catedrais românicas e góticas da Europa, maravilhas da humanidade. No chão delas, em seus alicerces espirituais, escondem-se pedras magníficas, plantadas com firmeza e amor a Deus, por sábios como Santo Agostinho. Iniciamos o curso, partindo de nascentes mais humildes do rio, que se torna caudaloso e profundo, até desaguar no oceano de Hipona, em cujas águas tantos outros sábios embarcaram seus navios. Deve ter sido particularmente proveitoso aos alunos o estudo de quem buscou radicalmente o sentido da vida em todo canto e só em Deus conseguiu repousar o coração.
O HOMEM NÃO SE REDIME SOZINHO – Agostinho é reconhecidamente uma das grandes cabeças da humanidade. Representa o máximo possível da filosofia cristã, na curiosidade genial dirigida toda ao Mistério transcendente e no entendimento de sabedoria como busca do conhecimento divino. Homem com H em todos os sentidos, demonstrou, menos com fervorinhos do que com a vida, que o amor a Deus é mais gratificante do que prazeres passageiros. Após juventude inquieta e libertária, experimentou e ensinou a absoluta necessidade que temos de redenção. Sendo a Redenção obra de amor, Agostinho passou-nos a experiência própria de que, em Deus, misericórdia vem antes da severidade. Os pecados de sua vida passada – nos dizem suas CONFISSÕES – esclarecem que não são eles que afastam de Deus, mas a distância que de Deus nós tomamos. Para os “sábios” de hoje, bela lição agostiniana: bem programado e bem sucedido como foi em vida, Agostinho encontrou seu sucesso maior no mergulho sem volta nas águas divinas.
ATRÁS DE GRANDE SANTO TEM OUTRO GRANDE SANTO – Os parágrafos acima foram pretexto para nos apresentarmos a Santo Ambrósio, bispo de Milão, mestre espiritual de Agostinho, instrumento para sua conversão. Em tempos de carismatismos rebolantes, escutemos trechos de alguns sermões de Ambrósio, na belíssima catedral de Milão. Vamos ao primeiro: - “Um operário cai do andaime, ao preparar vastos celeiros para vossas riquezas. Um outro despenca de alta árvore, quando catava uvas, a fim de preparar o melhor vinho para vossas orgias. Um terceiro afogou-se no mar, pois temia que faltasse o peixe para vossos banquetes. Um outro ainda morreu enregelado, quando caçava aves e lebres para vossos festins. Se algum deles não vos agrada, é chicoteado até morrer ante vossos olhos e seu sangue salpica vossos convivas. Para contentar uma cortesã, Herodes não encontrou melhor coisa do que assassinar o pobre”.
“O ADORNO DOS SACRAMENTOS É A REDENÇÃO” – Mais do velho Ambrósio: - “É melhor protegermos a causa dos pobres e nos expormos à desaprovação de alguns, como sucedeu por termos “desrespeitado” os vasos da Igreja, vendendo-os para resgatarmos escravos, do que sermos duros de coração... O Senhor certamente diria: por que permitiste que tantos necessitados morressem de fome? De certo não te faltava o ouro! Por que então não os saciaste? Não saberias responder a estes argumentos. E que poderias dizer? Talvez tinhas medo que faltassem os ornamentos à Igreja de Deus? Ele dir-te-ía que os sacramentos não precisam de ouro, nem agradarão pelo ouro aquelas coisas que não se compram com o ouro. O adorno dos sacramentos é a redenção dos escravos e dos pobres. Estes, sim, são nossos vasos preciosos!”
“VOSSAS MANSÕES VOS IMPEDEM ATÉ DE VER OS POBRES” – Lá vai mais Ambrósio: - “Até que ponto, ó ricos, quereis estender vossas loucas cobiças? Acreditais porventura serdes os únicos habitantes da terra? Por que explorais o pobre? O mundo foi criado para todos. A natureza não faz distinções, porque a todos nos gerou pobres. Não nascemos com as roupas, nem com a prata e o ouro. Nascemos nus, necessitados de alimentos e de roupas. E nus nos receberá a terra. Ao pobre como ao rico basta, para a sepultura, um bocado de terra; e a terra, demasiado pequena para os desejos do rico quando vive, engole-o inteiramente, quando morre. Como é possível distinguir, entre os mortos, ricos e pobres? Escavai a terra e mostrai-me o rico! Ó ricos, orgulhai-vos de vossas imensas mansões? Elas deveriam fazer-vos corar, porque elas poderiam alojar multidões inteiras e vós excluís os pobres. Vossas mansões vos impedem até de ouvir a voz suplicante dos pobres. Também é verdade que, se a ouvísseis, não a escutaríeis”.
“TEU GADO É TRATADO MELHOR” – “Ao construirdes vossas mansões, quisestes superar-vos a vós mesmos. Mas nunca estais tranqüilos, porque nunca vos contentais. Envergonhai-vos! Cobris as paredes e despojais os homens! Diante da porta de tua casa, grita quem não tem vestes para se cobrir e tu o desprezas. Implora o nu e tu perguntas a ti mesmo com que mármores preciosos podes cobrir teus pavimentos. O pobre te pede dinheiro e não o obtém; pede um bocado de pão e teu gado e teu cavalo são tratados melhor do que ele... O povo tem fome e tu fechas teus celeiros. O povo mendiga e tu te abarrotas de pedras preciosas. Desgraçado, em tuas mãos repousa o destino de numerosas pessoas. Poderias salvá-las da morte e não o fazes. Só com a pedra do anel que trazes no dedo poderias salvar uma infinidade de vidas humanas...O pão que os ricos comem é mais dos outros que deles, habituados que estão a viver da rapina e a sustentar seu luxo através das fraudes!” – Tai um bispo comunista, que viveu l6 séculos antes do fundador do comunismo!
Com amizade, examinando, na Quaresma, a insuficiência pouco generosa do seu comunismo – Luís
quinta-feira, 7 de fevereiro de 2008
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